sexta-feira, 13 de março de 2015

Olhos abertos na Perimetral: 10% é a mãe

Sou do bolicho. Da birita a preço de bom grado e do prato feito com amor e sazóns da vida real. Não é pedir demais. Cervejas comuns por mais de 10 pilas é um crime social, ambiental e antropológico. Sim. Elitizar um dos maiores lubrificantes sociais a tal ponto é uma insensibilidade com o seu semelhante ou assemelhado. Aí superfaturar na minha sede e querer que eu ainda contribua com um 10% de forma compulsória? Na bunada não vai dinha, não?
         Raramente faço questão de pagar os 10%. Não sou um ser humano pior por isto. É facultativo. Entre muito estudo, chimarrão e cuca já se estabeleceu que o pagamento dos 10% deve ser informado em letras grandes e visíveis. E também deve-se ostentar um cartaz com dimensões de, NO MÍNIMO, 50 centímetros de comprimento e sensacionais 60 centímetros de altura.
         Na última vez que fui no Perimetral, na Cidade Baixa, quando me desloquei ao caixa pra pagar informei o atendente que não queria pagar os 10%, porque de acordo com minhas experiências anteriores, nunca me informaram. O que deveria ser obrigação do estabelecimento.O preço já vinha embutido no pacote. Sobre a bandeira do constragedorismo asteia-se a má fé dos lobos maus. Por mais que pedi pra deixar os 10% de fora, o preço cobrado não bateu com o que gastei. Fiquei com as antenas de vinil tinindo. 12 conto numa Original. E ainda o cara pálida do atendente falou:
         — Aqui na volta o preço é assim mesmo.
         Então peguei o cardápio e fui ver. Não era 12 pilas a cerveja e sim R$ 10,50. E mostrei pra ele.
         — Calma, senhor.
         Calma é minha vó vendo novela de pantufa. Calmo é o crédito pessoal do Bill Gates. Calmo é um passeio em Quintão no inverno. Calmo não sou eu quando alguém tenta me passar pra trás de forma tão descarada.
         Olhos abertos na Perimetral, nos bosques e nas avenidas. 10% é a mãe. E la nave vá. 

quarta-feira, 11 de março de 2015

Wander Wildner: Existe alguém aí?

Investindo no lado pós-romantista, o “Existe alguém aí?”, oitavo disco na carreira de Wander Wildner, é uma crítica à sociedade urbana. Um chute na bunda do caos apocalíptico contemporâneo das grandes metrópoles criado pelo homem cifrudo. Conceitual e mais popular do que nunca, o disco conta com 10 canciones inesperadas. Em cada faixa um personagem é o herói de si mesmo e luta pra fazer a diferença do seu mundo interior para o exterior.
  - Até onde vivemos nossas próprias vidas? A maioria prefere viver a vida pelos televisores – conta o artista.
  Já na capa, idealizada por Wander e executada por Eloar Guazzeli, prédios se elevam por uma cidade chuvosa e quase alcançam o olimpo de Porto dos Casais. No meio desta selva de pedras, um personagem toca guitarra num terraço embaixo de um spoiler com uma ilha. Eis o personagem de "Numa ilha qualquer", um dos maiores hits do disco, e este é o primeiro sonho. Zarpar pra bem longe das metróples, viver um amor transcendental numa ilha distante dos pecados capitais das capitais.
  O disco canta a morte de Porto Alegre. O tiro no pé de uma cidade que pegou o caminho errado, que se perdeu nas próprias transversais de suas contra-mãos. Não existe mais procura, apenas oferta e demanda.
  - As pessoas não vivem suas próprias vidas. Optaram pelo caminho do lobo, por uma vida capitalista e consumista. Não se perguntam 'Quem eu sou?', 'O que faço neste planeta?', 'Pra onde vou'?. Ao invé de procurar dentro de si, procuram pra fora, copiam do outro. Não é uma questão de bem e mal - explica.
  No momento sua nave espacial intergaláctica está estacionada no Bom Fim. Uma morada com vista pras estrelas, pé de manjericão e produção artesanal de cerveja. Mas Wander Wildner não pertence a lugar nenhum. Já morou em Lisboa, Berlim, Guarda do Embaú, São Paulo, Rio de Janeiro, Lajeado e, claro, Porto Alegre. A solução, segundo ele, é sair da cidade. Este é o espírito da cousa.
      - A cidade não tem mais solução. Tá globalizada. Eu propiciei que a música me levasse à diversos lugares. Inventei isto. As pessoas tem liberdades e não usam o livre-árbitrio. A gente pode fazer qualquer coisa. Qualquer coisa. São infinitas possibilidades. Eu não tenho cidade. Mas as pessoas optaram por viver normas e convenções - conclui.
  No exterior gosta de ver as coisas de fora pra pensar diferente. Aí volta pras terras tupiniquins. Não gosta de pensar em alemão, inglês ou italiano. Já pensar em espanhol feito um amante mexicano, por vezes, ajuda no processo de composição. Afinal, é um poeta curvilíneo de pensamentos tortos.
 O romantismo acabou. O punk brega amassou as flores. Agora o romancismo é que impera na inspiração de Wander Wildner.
 —   O romantismo é a época da Jovem Guarda e o romancismo é o romântico de todas as épocas. O romântico sofre com a história porque é over. Nada pode ser muito mais do que outra coisa. O romancista vê de cima, toca teclados mágicos e anda em naves espaciais. É preciso se elevar para ver o mundo – diferencia o cantor.
Sorte, busca e desapego alimentam os bons momentos do proseador. O novo disco de Wander Wildner é uma HQ sonora, cheia de personagens e histórias bacanudas. Mostra que o virtual é uma ferramenta, mas que a aventura está lá fora. Que o poder de dentro é maior do que o dos “poderosos”. Só o som espacial faz voar. Então, procuremos para dentro e fujamos para as colinas. Sejamos feios, mas sejamos bonitos. Salve-se quem puder.





segunda-feira, 2 de março de 2015

Aguiar Cycle: O rei das magrelinhas invocadas

    O seu Aguiar, natural de Tapes, é o tipo de persona que já fala sorrindo. É um Quick Napolitano das amizades instantâneas. Casado com o ciclismo e amante dos esportes, há mais de 23 anos monta e customiza bicicletas, quase que uma bodas de prata. Já produziu e reproduziu mais de 1.500 bikes em sua árvore genealógica de ciclismo. Uma multidão de traseiros sprintando em cima destes atípicos veículos de andar pra frente que vem tomando conta da nossa querida Porto dos Casais. Ele é o rei das magrelinhas invocadas.
  A fama veio mais forte após o trágico atropelamento na Massa Crítica em 2011, pelo inesquecível e ileso Golf Preto de José Ricardo Neis, servidor do Banco Central. Após 4 anos, a cousa foi pra júri popular, veremos se vira causo ou lenda. Aguiar foi o primeiro ciclista a dar uma declaração e pedir a prisão do lacerdinha José. Não demorou muito e foi parar na RBS TV. Neis foi preso e logo solto, afinal nossa vasta Constituição sempre favorece brechas de leis para legitimar autênticos bandidos. Mas muito antes disto Aguiar, nosso camarada, já lutava bravamente pelo ciclismo. "Um corte vertical no trânsito", como sugere.
Veio pra Porto dos Casais em 2005 pra terminar a faculdade de Educação Física. Sempre na maciota e na boa, com a cabeça fria e o pé quente, ele fez uma cambada de amigos pedaladores, corredores e maratonistas.
Prefeito de Tapes por dois mandatos, seu pai, José Wilson da Silva, também foi relojoeiro. Nunca consertou um relógio, mas também nunca perdeu tempo. Aguiar logo se envolveu como voluntário do Ministério dos Esportes de Tapes. A troco de nada ele organizava maratonas, corridas de bicicleta, nados em águas abertas e até taco, se dessem bobeira nele. Tudo pelo esporte, pelo suor e pelo coração bombando, bombando, bombando.
Um belo dia resolveu fazer a travessia do Náutico pro Pontal, quase 8 km de nado livre. Chegou do outro lado, encontrou uma turma fazendo churrasco, comeu, proseou e se foi embora. Afinal, é assim que os campeões fazem. Gostou da brincadeira e assim começou oficialmente a Travessia do Pontal em Tapes, evento de natação em águas abertas que ganhou o Estado e logo depois virou torneio oficial deste Brasil baronil. É mole?
Pra montar uma bike com o Aguiar segue-se um breve roteiro de perguntas e respostas. É na espera que a coisa acontece. Existe toda uma análise antropológica, psicológica e fisiológica. Os níveis Zen são medidos por uma balança que capta os níveis ectoplasmáticos do vivente. 
    Transformar a bike na personalidade de um alguém não é tarefa fácil. Vai além dos 50 tons de cinza. Pode ser torto, curvilíneo ou quadrado. Até a bunda sentar na bicicleta tem muitas rodadas de diálogo, cafézinho e manuais de segurança no trânsito. Quantos por aí criam a imaginação? Pedalar um sonho é estar nas nuvens.